Lady Gaga concedeu uma entrevista para NPR, onde falou mais sobre Til It Happens To You, David Bowie e muito mais. Confira a tradução:

Em praticamente qualquer performance da Lady Gaga, você pode contar com um espetáculo: luzes brilhantes, palcos elaborados e muitos, muitos figurinos diferentes. Quando ela tomou o palco do Grammy Awards esse ano, as coisas não foram diferentes - com exceção de que ela estava usando suas famosas artimanhas em serviço das músicas de outro artista. Enquanto ela rodava através do repertório de David Bowie em uma tragetória dentro da carreira dele em tributo ao ícone falecido, foi notado que a cantora de 29 anos é um camaleão tão incrivelmente talentoso quanto o seu ídolo. Depois de ganhar seus próprios 6 Grammys, um Golden Globe por sua atuação em American Horror Story: Hotel, duetos com Tony Bennet, um hino nacional no Super Bowl e um vestido de carne muito famoso, parece ter bem pouco que a mulher nascida Stefani Germanotta não possa fazer.

E mesmo assim, ela recentemente se surpreendeu. Ao lado da veterana hitmaker Diane Warren, Gaga co-escreveu a música "Till' It Happens To You" para o documento "The Hunting Ground", sobre estupros em campus universitários. A faixa é concorrente ao Oscar, mas a maior revelação é uma pessoal. Como Warren, Gaga é uma sobrevivente de abusos sexuais, e diz que a decisão de trabalhar na faixa não veio facilmente - mas uma vez que estava feita, histórias de outros sobreviventes apareceram, algumas atreladas à afirmação de que eles nunca haviam se sentindo confortáveis para compartilhar as experiências até agora.

Lady Gaga se juntou com Michel Martin do NPR de Nova Iorque para falar sobe escrever músicas que são muito pessoais, como fãs e artistas se beneficiam de apoio mútuo, e o que David Bowie significava para ela quando era uma adolescente se aventurando na sombra de Aladdin Sane pela primeira vez.

Michael Martin: Eu quero começar falando de Til It Happens To You, que está indicado ao Oscar. Eu sei que não é fácil falar sobre isso, mas eu posso perguntar como você chegou a se envolver nesse projeto?
Lady Gaga: A música é algo que saiu de um grupo de mulheres que se juntaram e decidiram fazer a diferença. Eu, Diane Warren e Bonnie [Greenberg], que era a supervisora musical. Quando nós começamos a conversar, eu não tinha certeza do que fazer. Eu tenho uma relação muito desconfortável com este assunto pois é muito pessoal para mim, e eu não tinha certeza que estava pronta para fazer parte disso. E assim que eu conheci Diane e ela me falou sobre o que queria fazer, eu sabia que ia ter que ser forte, e eu teria que ajudar a contar essas histórias para o mundo. Então Diane e eu nos reunimos na cidade de Nova Iorque. Ela tocou a musica que ela havia idealizado para mim, eu imediatamente comecei a chorar. Eu estava muito insegura, mesmo naquele momento, se eu conseguiria fazer aquilo. E ela disse, "Bem, eu quero que você faça essa música ser sua. Eu quero que isso seja algo com o qual você se conecte." E nós começamos a mudar a música juntas — fazendo com que ela soasse bem e refletisse as nossas experiências com abuso sexuais. Eu acho que é uma longa história, e é uma história muito complicada. E começa comigo, quando eu era uma garota nova, eu tive essa experiência traumática, e agora isso realmente está terminando pra mim de certa forma, enquanto me curo disso escrevendo sobre a experiência com Diane.
M: Algum outro artista veio a você desde que você gravou a música para falar sobre esses problemas? Parece que muitas pessoas na indústria da música que já sofreram esses abusos e não falam disso por anos, ou nunca falam.
LG: Sim, são muitas. Eu não irei revelar nomes de pessoas que vieram falar comigo pessoalmente sobre experiências similares. Mas tem muitas pessoas, homens e mulheres ao redor do mundo, que tiveram experiências de abuso sexuais não só nos campus ou na indústria da música, mas dentro de suas próprias famílias e seus próprios relacionamentos. Tem sido surpreendente o número de cartas que eu e Diane recebemos, o número de pessoas que nos param na rua para falar sobre a música e nos dizer o quanto ela significa para eles.
M: Como artista, e em sua vida pessoal, você já trabalhou com experiências emocionais muito complexas e fortes. Com o fato de que você tem uma voz que você pode usar para popularizar um tópico, como você decide sobre o que quer falar?
LG: Bem, eu sempre fui uma ativista sobre coisas que autenticamente foram parte de minha vida, e com quais eu me sinto conectada. Em termos do meu envolvimento com "Don't Ask Don't Tell", casamento igualitário e política anti-bullying, problemas sociais e emocionais na escola - essas são todas coisas partem da minha relação com o mundo e com meus fãs. Eu ouço eles, eles escrevem cartas para mim; eu estou atualizada sobre o que as pessoas querem mudar no mundo, e eu quero ser uma parte dessa evolução. Eu sinto que genuinamente é isso que você faz quando é um artista, você luta pelas pessoas a sua volta.
M: Eu imagino que isso seja cansativo, emocionalmente e fisicamente. Como você concilia esse trabalho com todas as outras coisas que você faz?
LG: Eu não vejo isso dessa forma, você sabe? Isso que eu faço, carregando mensagens importantes na minha música, não é separado do meu trabalho como artista comercial; eles são o mesmo e um só. Eu sempre estarei pensando sobre o que a minha voz significa. Quando eu tinha 22 anos, lançando minhas primeiras músicas, eu era um bebê - e ninguém realmente vê você como algum tipo de modelo a seguir ou algo assim. Mas quando você fica mais velha, você percebe que tem atenção de muitas pessoas mais novas. E você pensa, " OK, bem, o que eu deveria falar agora? O que eu posso dizer que terá um impacto positivo?". Você sabe, trazendo de volta a Til It Happens To You, o que aconteceu comigo foi há 10 anos atrás. Então eu fiquei muito famosa do dia pra noite, eu senti que foi assim, e eu nunca tinha tempo para lidar com os meus problemas. Assim que você começa a fazer dinheiro vendendo sua música, tem muita gente ao seu redor que está muito animada sobre o que você tem a oferecer financeiramente para os negócios, e esquecem que existe uma pessoa que está atrás de tudo isso. Então minha equipe agora, passa os dias assegurando que eu esteja feliz e saudável e que eu estou capaz de focar nas coisas que amo.
M: Nós temos que falar sobre David Bowie e seu tributo para ele no Grammy desse ano. Ele é alguém com quem as pessoas lhe comparam em certos aspectos: constantemente se reinventando, testando os limites da performance. A sua apresentação usou de computação gráfica para desenhar o famoso raio dele no seu rosto enquanto você cantava. Como você chegou a esse ponto?

LG: Bem, no momento que eu vi a capa de Aladdin Sane pela primeira vez, eu tinha 19 anos e mudou a minha perspectiva sobre tudo, para sempre. Eu lembro de tirar o vinil da capa e colocar no meu toca-discos - que ficava perto do fogão na cozinha, por que eu estava vivendo nesse apartamento muito pequeno e eu tinha uma mesa reversível acima do meu fogão. "Watch That Man" começou a tocar, quero dizer, esse foi o começo do meu nascimento artístico. Eu comecei a me vestir de forma mais expressiva. Eu comecei a ir na biblioteca e ler mais livros sobre arte. Eu tive aulas de história de arte. Eu me juntei a uma banda. Eu acho que o que estou tentando lhe dizer é que eu e meus amigos em Nova Iorque, nós vivíamos um estilo de vida totalmente imerso na música, moda e tecnologia desde que éramos crianças - e isso é por causa dele. Eu nunca estaria aqui, ou teria a filosofia que tenho, se eu não tivesse alguém para me inspirar e que expandiria minha mente de forma tão intensa. Você sabe a forma que Nile Rodgers fala sobre Coltrane, e como Coltrane fez ele se sentir com o jazz? Isso é o que David Bowie é pra mim. Você conhece ou vê um performer que tem algo que é de fora desse planeta, de outro tempo e isso muda você pra sempre. Eu acho que todo o mundo tem isso, você não? Aquela coisa que você viu quando jovem que fez você pensa, "nossa, agora eu sei quem eu sou".
M: Como você se sente agora que o tributo terminou? Quero dizer, teve que ser formado tão rapidamente, foi tão complexo e teve tantas camadas.
LG: Como eu me sinto agora que acabou? Eu sinto que minha carreira inteira é um tributo a David Bowie.
M: Então não acabou! É contínua, certo?
LG: Ainda continua. Eu tenho assistido seus vídeos todos os dias, e tenho ouvido muito Blackstar, seu último álbum, que é uma obra musical incrível. Eu acho que uma das melhores coisas que um artista pode fazer é uma obra prima tão incrível em louvor a si mesmo. Você pode imaginar? Ir para o estúdio todo o dia e colocar seu coração no lugar, onde você está dizendo adeus para a vida? Quero dizer, a arte dele o fez forte.


Tradução por Giovanna
Revisão por Milena Rodrigues