Foi divulgada no último dia 6 a entrevista completa de Lady Gaga para a edição de janeiro da "V Magazine". A revista contará com 16 capas, que terão como destaque a Mother Monster e pessoas que devotaram suas vidas pela arte e a moda, como Alexander McQueen, Karl Lagerfeld e Hedi Slimane. Confira a tradução.

James Franco: Vamos falar sobre essa sessão de fotos.

Lady Gaga: Então, o que eu fiz aqui foi: meu amigo Chadwick nos instalou e fotografou dentro de uma casa que nós alugamos e foi como uma verdadeira American Horror Story. Uma favela de American Horror Story. Nós não fizemos pose nem nada do tipo. Nós improvisamos por, tipo, cinco horas. Nós só criamos personagens e atuamos no espaço. Foi baseado em parte por Uma Rua Chama Pecado (filme norte-americano de 1951), mas vagamente, e nós só criamos nossos próprios espaços dentro da história. Foi só um lindo dia e nós tiramos essas lindas fotos. Então, (maioria do elenco de American Horror Story): Kathy Bates, Wes Bentley, Chloë Sevigny, Finn Wittrock, Cheyenne Jackson, Angela Bassett, Matt Bomer, and Denis O’Hare. Eu só pedi que todos esquecessem que as câmeras estavam ali, por um tempo, e só ficar lá juntos. E nisso Chadwick foi realmente documentando tudo enquanto nós estávamos fazendo um peça ao vivo. Nós passamos um tempo falando sobre isso em nossos trailers do lado de fora, e quando nós entramos, nós meio que caímos de cabeça nisso. Foi maravilhoso como aconteceu. Todo mundo reagiu diferente a isso. Eu pedi a todos para melhorar o seu dia de folga. Nem todo mundo estava super animado imediatamente. Eu tive que trabalhar muito com eles para explicar, e assim que chegamos lá, todo mundo se juntou e aconteceu tudo tão naturalmente e fácil e essas lindas fotos aconteceram.

JF: Como Kathy Bates se saiu?

LG: Sabe, ela estava lá conosco. Quando ela chegou, no começo ela estava tipo "Eu não tenho plena certeza de como vamos fazer isso". E dai Wes começou a pular em cima da mesa da cozinha e ele estava jogando facas pelo comodo e esfregando pizza em seu rosto. Ela estava jogando a bandeira americana pelo cômodo, a bandeira... isso é incrível. Kathy só abriu uma cerveja e começou a beber e então do nada ela começou a falar, e ela era nossa mãe, e eu era sua filha, e Cheyenne e Wes eram meus irmãos. Wes estava sendo inapropriado comigo, e ela estava dizendo a ele o porco que era. O que foi realmente incrível foi ver que todos nos sentimos seguros o suficiente para recriar aquilo fora do estúdio, sem o show. Mesmo que Ryan Murphy tivesse aparecido e ele estava lá conosco, parte do que eu queria mostrar com esse ensaio foi a camaradagem que nasceu desse show e também para mim, como alguém que chegou e não estava no show antes. Eles realmente me abraçaram como pessoa, e eu desenvolvi uma amizade realmente sólida com eles. Eles realmente confiaram em mim, vindo no final de semana para fazer algo como isso, e resultou em alguma coisa que eu não acho - quero dizer, eu apenas acho que nunca foi feita antes.

JF: Ryan Murphy te procurou para o papel de Condessa em American Horror Story?

LG: Eu estendi a mão para Ryan e disse a ele que eu era uma grande fã do show e que eu realmente queria trabalhar com ele. Ele basicamente só disse sim, imediatamente. Eu disse a ele que queria interpretar uma mulher forte mas perigosa. Nós começamos a conectar ideias pra lá e pra cá, mas a Condessa realmente meio que se tornou quem ela é depois de filmarmos os primeiros três episódios. Eu tinha uma ideia de que ela era forte, e eu pesquisei muito para faze-la tão completa dentro de mim quanto era possível, mas foi quando, ao longo do tempo, nós meio que íamos e voltávamos, para chegar em como ela seria dinâmica. Todo mundo estava meio que muito insistente que ela tinha vivido 100 anos e então ela era fria. Eu disse, "Eu sinto como se eu tivesse vivido 100 anos e eu não sou sempre fria. Às vezes eu sou bem vulnerável e insana, fraca e imprudente.

JF: Ela parece solitária, com uma necessidade nela de se conectar.

LG: Há um desejo insaciável que está por cumprir. Há uma série de paralelos entre a personagem e a minha própria vida. Através de 100 anos ela mudou muito. Você aprende sobre o jeito que ela era antes de se tornar má - ou o que as outras pessoas pensam como má. Eu vejo como prática. Ela precisa se alimentar. Ela precisa sobreviver. Esse é só o jeito como ela existe, e é diferente de como ela existia antes. Então, o que acontece conosco, como humanos, quando começamos a mudar quem nós somos ou interrompemos nossas personalidades ou nossas almas para sempre? O que são essa instâncias e o que acontece quando elas ocorrem? O show faz você fazer perguntas sobre o bem e o mal - por que o hotel é um lugar mal e tanto, mas quando você vê o que todos estão passando dentro dele, não é tão longe do que todos nós passamos. O que você estaria disposto a fazer para sobreviver? O que você estaria disposto a fazer para ser feliz? Desse jeito, não é tão difícil de se relacionar com um drogado ou alguém que não pode viver sem uma agitação.

JF: De algum modo é paralelo com o que você fez em vídeo clipes.

LG: Eu consideraria qualquer coisa que eu fiz em meus vídeo clipes como sendo a Condessa. Eu não sei se Ryan Murphy é, mas eu tenho certeza que eu mesma sou, em alguns aspectos, inspirada pelas coisas que eu já fiz. Em alguns paralelos você pode chamar exatamente, especialmente quando se está fazendo fantasia. Então, minha inspiração para quando eu mato na série é espantar um mosca. Eu já espantei uma mosca antes. Eu nunca matei alguém com facilidade ou sem nenhum esforço - eu nunca matei ninguém de qualquer jeito - mas eu já espantei um mosca e provavelmente fiz parecer que não importava para mim. Outras vezes eu espantei um mosca e me senti muito mal sobre isso e foi uma coisa grande e eu tive meu momento.

JF: Então você acha que sua atuação e sua música são interpretadas diferentes?

LG: Eu realmente não tenho um conceito de como as pessoas estruturam meu trabalho.

JF: Você não lê nada a respeito?

LG: Eu vejo artigos e coisas assim, mas eu não sei se acredito que isso é exatamente como as pessoas interpretam meu trabalho. Quem pode dizer como as pessoas veem? Eu passei todas as minhas manhãs e noites aprendendo minhas falas, fazendo elas entrarem no meu corpo, e então tentando deixar elas voarem o máximo possível na tela, sabendo muito bem que eu não estou nem perto de ser tão completa quanto qualquer um nesse show. Eu apenas preciso confiar no meu amor e minha paixão por atuar. Quem sabe se as pessoas veem como diferente da minha música? Eles podem achar que não é bom, podem achar que é, eles podem achar que é melhor que a minha música, ou pior do que ela. É difícil dizer se eu poderia saber, ou talvez até ligar. Eu preciso fazer e ser isso ou eu vou acabar morrendo, eu acho.

Capa da V Magazine

JF: Eu vi sua participação na série Sopranos. Você já atuou antes.

LG: Oh isso é terrível. É, eu frequentei o Lee Strasberg institute desde que eu tinha 11 anos. Eu estudei muito método de atuação.

JF: Como você entra no personagem?

LG: Eu estudo minhas falas em toneladas. Essa é a primeira coisa. No caminho para o trabalho todo dia, quando estou dirigindo para o estúdio, eu tenho algumas coisas que me lembram da Condessa - suas roupas e redes de cabelo ou até maquiagem e essas coisas. Eu só coloco minha maquiagem e faço meu cabelo igual ao dela e escuto músicas que me lembram dela, dependendo de qual século e década estamos. Eu tenho várias músicas diferentes que escuto. Então em meu caminho para o trabalho eu meio que me torno ela. Eu vou ao set ensaiar, e então eu volto e boto minha peruca e minhas roupas. Essa é meio que a última coisa. Isso é totalmente irrelevante para mim, as roupas. Eu sei que parece uma grande coisa e uma grande parte disso, mas eu passei muito mais tempo praticando como eu ando e as coisas que eu digo. Eu também passo muito tempo relaxando entre as tomadas e antes de eu entrar em cena. Eu quase medito. Eu tenho que entrar lá e esquecer o que eu aprendi e apenas falar. Como com Chloë (Sevigny) - ela é minha amiga e nós estamos sempre rindo antes de eles gritarem "gravando" (mas ai) é como se nós tivéssemos jogado tudo pela janela e nós simplesmente sintonizamos em nossos papeis. Nós só estamos escutando uma a outra. É engraçado. Tem sido importante para mim como pessoa porque - Eu tenho certeza que você entende isso porque você é famoso - 90 por cento das interações que você tem com seres humanos, não é como se eles ligassem de verdade para ouvir sobre você ou algo do tipo. Quando seu trabalho é ouvir e ter outras pessoas que escutem você, é essa coisa mágica e romântica que tem sido ótima para mim. Eu tenho conversas reais o dia todo, e é meu trabalho entender como escutar e ser honesta. E eu nem sei se sou boa. Eu só sei o que eu estudei na escola - eu frequentei a Tisch, também. Eu sou uma total nerd por teatro. Eu li Stanislavski e tudo isso. Mas o ponto de partida é que eu tive alguns generosos atores abertos para mim no set.

JF: O que você aprendeu com eles?

LG: Tudo. É só o que faço, aprender o que eles me ensinam. (risadas) Eu estava envergonhada no começo. Eu não queria improvisar, ficar a vontade e arriscar com todos esses ótimos atores como Kathy Bates. Tipo, quem sou eu? Eu sou tipo, alguma pop star. Eu não vou fazer isso. Eu vou lá dizer minhas falas como uma boa garota e ir embora. Então, com o tempo, você sabe, as coisas começaram a mudar. Eu fiz uma cena de amor com o Matt Bomer, e não estava nem roteirizado para a gente fazer sexo no final da cena, mas nós simplesmente começamos a fazer sexo. Foi muito louco, mas ele é meu amigo. Nós estávamos rindo depois, nós não planejamos. Foi só o jeito como nós dissemos as falas um para o outro, nos levou aquele lugar. Toneladas de liberdade no set. Quero dizer, no primeiro episódio, algumas das minhas falas foram bem ensaiadas. Lá pela minha terceira cena eu comecei a ficar ousada. (risadas) Haviam pontos altos o tempo todo - pessoas matando por amor - então eu e os membros do elenco estávamos sempre enfrentando os diretores e criadores e os escritores sobre quão física ia ser a cena.

JF: Então eram vocês que estavam tentando aumentar o fogo em vez do contrário?

LG: Ah sim. Não são os diretores nos dizendo. Nós estamos dizendo a eles, com certeza. Por que parece uma injustiça para os personagens terem que ser bonitos e seguros. Parece que temos que ir atrás para que seja compreensível para o vício de alguma forma por que o vício não é bonito. O vício é aterrorizador, mórbido e provocativo. Isso é muito sobre o que nós estamos falando.

JF: Uma das coisas que eu realmente admiro sobre você é que você tem a habilidade de puxar essas diferentes esferas juntas: música e arte, atuar e performar...

LG: E moda.

JF: E moda. Então quando você decidiu que queria atuar em um show que ganhou um Emmy, com atores que ganharam Emmy's, como você lidou com a...

LG: A pressão?

JF: É, a pressão. O ceticismo.

LG: Eu acho que nenhum artista deve se identificar com um meio mais do que o outro. Eu acho que está tudo bem e lindo em ser estudado em muitos meios. Eu suponho que eu simplesmente não ligo porque eu amo tanto e nada poderia valer mais do que alguém acendendo o fogo da minha paixão. Eu sei que você sabe que, você passa por limitações na sua carreira fazendo coisas que não te fazem sesentir completo e uma parte de você morre. Quando você começa a trabalhar em algo que você se sente vivo novamente, nada pode valer mais do que isso. Eu só estou tão viva. Eu vou para os ensaios com meu jeans e minha camiseta com meus atores e nós entramos lá, nos sentamos e falamos sobre as cenas. Eu sinto como se estivesse no colégio de novo, só que é melhor porque eu odiava o colégio (risadas).

JF: Eu me lembro de quando nós estávamos na festa de natal do Klaus [Biesenbach], você estava falando sobre ser muito criticada por uma colaboração com Jeff Koons (na capa do ARTPOP).

LG: Quem sabe? Eu poderia ter lhe dito inúmeras coisas. Eu podia ter te dito algo. Mas agora que eu me lembro disso, eu não sei se alguém já criticou minha colaboração com Jeff – (eles estavam), provavelmente, só críticos sobre mim, ponto. Eu suponho que você passa por ondas disso na sua carreira e você aprende com ela. Você passa por uma adolescência. Eu acho que eu apenas passei por esse tempo. É um choque forte no começo. Você sabe, eu me importo tanto com o meu trabalho, então quando as pessoas falam coisas ruins sobre os presentes que você faz – os pequenos presentes de arte – só faz você se sentir mal. Alguns de nós somos sensíveis... Mas eu fiquei mais durona com o passar dos anos. Eu apenas sigo minha intuição como artista. Coisas que eu quero fazer e acredito, as faço totalmente. Você sabe, quando eu fiz The SoundOf Music (tributo no 87 Oscar) , eu só estava estudando aquela música. Eu disse pra todo mundo que eu trabalhei com aquilo e que eu não poderia fazer aquela performance a menos que eu tivesse total disciplina e foco. Eu não posso vender nada enquanto estou fazendo isso. Quando você compromete sua vida a fazer música ou arte, você também pode se comprometer a fazer dinheiro. Um comprometimento com o dinheiro é – significa que você está dançando com o diabo. Isso significa que o que você está fazendo está relacionado a fazer dinheiro. Eu só acho que é bem melhor não fazer isso – então você não precisa se sentir mal pelo que você faz. Você pode se sentir tão orgulhoso disso, de cada performance, de tudo.

JF: Você está trabalhando em um novo álbum?

LG: Sim, eu escrevi muito durante o ano passado. O show realmente afetou minha voz, eu devo dizer.

JF: Como assim?

LG: Eu estou usando minha escuta de atuar mais nas minhas músicas, o que é crucial, porque é música. Quem sabia que podia ouvir ainda mais? É incrível até mesmo falar. Há uma enorme liberdade e uma imprudência, mas há também uma sofisticação na série. Há muita libertação, mas é uma libertação muito chique. Aqui está o que eu vou dizer: quando eu não estava trabalhando na série eu era verdadeiramente miserável porque eu não tinha um lugar seguro para libertar qualquer um dos meus vícios. Agora eu tenho um lugar seguro para os meus vícios, então quando eu estou fazendo música eu tenho muito mais clareza. Tenho um pouco menos de um instinto para ser imprudente com a minha música, porque agora eu sou imprudente em outros lugares. Então agora eu estou pensando mais sobre o que é que eu quero dizer e o que eu quero deixar na Terra. É menos uma expressão de toda a minha dor. Haverá um pouco da minha dor no álbum, com certeza, mas será mais do que isso. Meu último álbum estava cheio de uma tonelada de dor. Aquele álbum inteiro. É quase como se você não pudesse mesmo chegar ao que era. Agora, a série me dá uma saída para colocar as coisas em algum lugar, então quando eu chego até o piano eu já estou em um lugar mais profundo. Eu tenho algo completamente diferente para explorar.

JF: Atuar envolve muito mais colaboração.

LG: Quando eu estava me apresentando com Tony hoje, - eu estava me apresentando com Tony Bennett no Lincoln Center e eu estava cantando minhas músicas – eu podia sentir a mim mesma realmente revisando meus pensamentos enquanto eu estava cantando a música, enquanto também improvisava. Apenas tomando um passo adiante. E eu sabia que era de atuar. Quando eu estou atuando é o mesmo tipo de coisa: eu estou preocupada, eu vou começar a cantar no meio da cena! Eu tenho medo de desviar para o meio errado ou que minha voz vai soar... Afetada.

JF: Você vê as musicas como personagens, ou essa é você?

LG: Assim, elas são todas eu. Eu vejo a Condessa como uma parte de mim. O que eu sou como pessoa é uma mistura de mim mesma, Stefani e Gaga. A Condessa é tudo em uma.

JF: Quando você veio ver minha peça na Broadway, Of Mice and Men, dois minutos depois de a cortina subir, eu ouvi uma agitação da multidão. Eu acho que você entrou usando uma linda roupa e um chapéu enorme. Fez-me pensar: eu não sei se você está sempre on – e de algum modo se você pode evitar. Se você é uma figura pública, em certo ponto, as pessoas só projetam você. Sua pessoa pública começa a se misturar com quem você é. Eu e você podemos pensar que nós sabemos quem somos no privado, mas aquela persona pública – se torna sim uma parte de você. Você é um exemplo central de alguém que segue seus instintos, mas sua persona pública é tão grande que você não pode evitar ter uma grande estampa em sua vida.

LG: Eu já disse antes. Tudo que eu criei de mim mesma é uma coisa que eu fiz para me curar de um tipo de particular de dor que eu sempre senti que era ajudada por coisas criativas. Não é só uma grande parte de mim, mas é uma parte de mim que me faz inteira. Realmente e verdadeiramente. Eu não poderia sobreviver sem a Lady Gaga, que é o que eu sou. É a coisa que me fez forte e me ajudou a sobreviver. Eu ligo muito pra isso, não é separado. Mas quando eu saio, eu tenho uma escolha? Claro que eu tenho uma escolha, mas eu escolho não esconder o que eu sou. Eu posso sair de jeans quando eu quero, mas eu tenho que dizer, para alguém como eu, não é muito divertido sair quando você sente que tem que esconder quem você é. É como se fosse contra tudo o que eu defendo.

Tradução por Mariana Guedes Gomes
Revisão por Fellipe Pepi e Milena Rodrigues