Antes da pré-venda da trilha sonora de Nasce Uma Estrela ser lançada, a revista LA Times divulgou uma entrevista feita com Lady Gaga, diretamente de sua mansão em Malibu, alguns dias antes da cantora viajar para Veneza.
Na matéria, Gaga fala bastante sobre sua experiência antes e durante a gravação do filme. Leia a tradução completa:
"Lady Gaga se entrega e encontra seu elemento de atuação em 'A Star Is Born' de Bradley Cooper
Ela desceu as escadas e ali estava ele a encarando. Ele caminhou em direção a ela, examinou seu rosto: corretivo, máscara, blush.
“Tire isso”, Bradley Cooper disse a Lady Gaga.
Ela percebeu algo na sua mão. Era um removedor de maquiagem. Com isso, ele apagou as cores desde a testa dela até seu queixo.
Essa é a mulher que Cooper queria no seu filme, A Star Is Born. Não a estrela pop disfarçada com pinturas no rosto, enfeite de chapéu e perucas. Apenas Stefani Germanotta. “Completamente exposta”, ele disse. “Sem artifícios”.
Até aquele momento, em 2016, durante um teste na sua casa, Gaga não havia percebido o quanto ela queria o papel - um papel desempenhado por Janet Gaynor, Judy Garland e Barbra Streisand antes dela. E para conseguir isso, ela teria que “se entregar completamente e confiar” em Cooper. Ela não poderia ser aquela garota do Lower East Side que passava horas fazendo sua maquiagem antes de seus shows. Ela tinha que deixar a câmera dar um zoom no seu rosto usando apenas batom, um creme e nada mais.
“Me colocou exatamente no lugar que eu precisava estar, porque quando meu personagem fala sobre o quão feia ela se sente — aquilo é real”, Gaga relembra. “Eu sou muito insegura. Eu gosto de pregar, mas eu nem sempre faço aquilo que eu prego”.
Alguns dias antes de ir para a Itália para a estreia mundial de “A Star Is Born” no Festival de Filmes de Veneza, Gaga está sentada na sala de estar de sua casa em Malibu — uma casa de $23 milhões, seis hectares com duas pistas de boliche, arena de hipismo e uma sala segura. O filme, que é a estreia como diretor de Cooper, é a quarta versão da história a ser feita para as grandes telas. Nessa última, que será lançada pela Warner Bros. no dia 5 de outubro, Cooper estrela como Jackson Maine, uma estrela do rock ’n ’roll cujo sucesso está em risco por causa de seu vício em drogas e álcool. Mas sua vida encontra um novo propósito quando ele conhece Ally (Gaga), uma cantora aspirante que se torna tanto sua musa criativa como também sua namorada. Jackson decide levar Ally com ele em sua turnê, mas enquanto a carreira dela decola, os demônios dele ameaçam sabotar a felicidade dos dois.
Apesar de ela já ter vencido um Globo de Ouro por sua performance em American Horror Story e ter se apresentado nos maiores palcos do mundo — incluindo o Oscar e o Grammy — a Warner Bros. ainda queria que Gaga fizesse testes para interpretar Ally.
“Aquilo foi o estúdio — não foi Bradley ou os produtores, mas a antiga executiva da Warner Bros. que não estava convencida de que Gaga deveria levar o papel”, explica Bill Gerber, um dos produtores do filme que está ligado ao projeto desde 2007, quando Clint Eastwood foi indicado para dirigi-lo. “Então nós os convencemos. Bradley acreditava nela, e a Warner foi generosa o suficiente para fazer um teste de verdade. Não era unânime até o teste ser feito, mas quando eles viram levou segundos para que dissessem sim”.
Gaga diz que entende o motivo do estúdio querer testá-la, notando que algumas pessoas ‘‘não sabem como eu sou’’. De qualquer forma, opositores a alimentam: ‘‘Eu sou uma garota que diz, ‘Pode vir que eu vou te mostrar’”.
Aos 17 anos, depois de estudar no Lee Strasberg Theatre & Film Institute, Gaga foi aceita no prestigiado Projeto Collaborative Arts 21 da Universidade de Nova Iorque, um conservatório musical de teatro e da companhia de teatro da Broadway. Mas ela não prosperou lá. Ela não estava conseguindo testes, e aqueles que conseguia não foram tão bem. Ela quase participou em uma turnê local de “Rent”, mas os produtores decidiram que ela era jovem demais. Então, depois de apenas um ano na NYU, ela saiu.
"Eu estava frustrada com o sistema”, ela disse, “então eu decidi sair por conta própria, pagar meu próprio aluguel, trabalhar em três empregos, fazer minha própria música e gravar no meu apartamento”.
É um pouco difícil visualizar aquela versão de Gaga quando ela está na beira do sofá, com as costas retas, ainda usando o vestido preto Alaïa e saltos agulha que ela colocou para fazer um ensaio fotográfico mais cedo naquela tarde. A mesa de centro na frente dela está coberta com cristais rosa e revistas, incluindo uma com ela na capa.
Uma assistente entra na sala para oferecer uma garrafa de água. Também está na casa de Gaga: seu empresário Bobby Campbell; um membro da sua equipe de publicidade; e sua mãe, Cynthia Germanotta, que veio visitá-la de Nova Iorque. Os buldogues franceses de Gaga estão lá fora no pátio, que ignoram o Pacífico, e choramingam ocasionalmente frente às portas de vidro fechadas.
Tudo isso está sendo assistido de longe em câmeras no celeiro, que habita os dois cavalos de Gaga e seu time de segurança, que guardam os celulares de convidados enquanto estão dentro da residência da cantora.
Para interpretar Ally, Gaga tentou se distanciar de tudo isso. Ela se lembrou da garotinha que cresceu obcecada com Garland — a garotinha que assistia o Oscar enrolada em um vestido feito de cobertores, aceitando um Oscar falso em uma caixa em frente a televisão. E ela pensou muito sobre como ela chegou na indústria da música quando — assim como sua personagem — muitos diziam para ela que ela tinha a sonoridade certa, mas não a aparência certa.
“Eu nunca chorei, mas eu só segurava minhas músicas como se fossem minha vida e eu falava, ‘Você só vai tirá-las de meus dedos mortos e frios’”, Gaga lembra de suas conversas antigas com seus executivos musicais. “O que torna as coisas mais fáceis para mim é que eu escrevo minhas músicas, então eu não tenho que implorar por músicas ou para que alguém me ajude. Eu faço sozinha”.
Para as performances musicais de Ally — algumas delas foram filmadas no palco do Coachella, na semana entre os dois shows de Gaga como cantora principal do festival musical em 2017 — ela decidiu suavizar as coisas. Ela não iria ranger os dentes ou gritar com o público ou jogar suas mãos no ar. E ela tentou se aprofundar na depressão da personagem, focando em o quão próximo Ally estava de desistir de seus sonhos antes de conhecer Jackson.
“O que é diferente entre Ally e eu é que quando eu queria ser uma cantora, eu tive um bom desempenho desde o princípio”, ela disse. “Eu levava meu piano de bar em bar para cantar. Eu ligava para pessoas, fingindo ser minha empresária para conseguir shows. Eu realmente acreditava em mim, acreditava que eu podia fazer isso e que ninguém iria me parar até eu conseguir... A verdade é que, quando eu conheci Ally, ela tinha desistido dela mesma. E isso é muito diferente de mim. Eu nunca fui abalada pelas adversidades. A verdade é que, se nós não estivéssemos sentadas aqui hoje, se eu não tivesse vendido os álbuns que vendi, eu ainda estaria em algum bar tocando piano e cantando. É apenas quem eu quero ser”.
Gaga trabalhou com a tutora de atuação Susan Batson, que treinou Nicole Kidman e Juliette Binoche. A professora disse que ela achou a nova atriz “excessivamente receptiva ao trabalho”, a descrevendo como “quase além de profissional”.
“Foi seu primeiro [papel de protagonista], mas você nunca saberia disso, e eu acho que tem a ver com o fato de que ela já fez tantas apresentações”, Batson disse. “A Lady Gaga que o público conhece? Eles não a verão”.
Ficando confortável no set, Gaga admite, levou um tempo. Depois de meses de preparação, ela apareceu no primeiro dia de filmagem com suas falas decoradas. Cooper chegou no set para se juntar a ela em uma cena, mas ele começou falando uma frase que não estava no script. Ele estava tentando relaxar Gaga, mas ela não entendeu e respondeu falando a mesma fala várias vezes.
“Finalmente, ele disse, ‘Você está bem?’ E então eu comecei a chorar”, ela disse rindo. “Então eu deixei isso para trás e fizemos a cena. Eu tive que deixar as palavras decoradas para lá”.
Os dois ainda iriam se tornar amigos bem próximos durante a produção, desenvolvendo uma espécie de código enquanto trabalhavam no set. Se Cooper queria que Gaga despertasse um sentimento de afeto, ele sussurrava “Tony”, sabendo que ela tem uma relação muito próxima com o cantor Tony Bennett e que quando ela pensava nele ela tem “um certo sentimento de amor”. Se ele precisava que ela focasse, ele diria coisas como “ninja” ou “assassino”.
“A curva de aprendizado dela é insana, principalmente do primeiro para o segundo dia”, Cooper relembra. “Todo mundo já sabe que ela tem um talento dado por Deus como cantora, e ela é capaz de utilizar isso para atuar. Se é algo que ela quer explorar, eu serei muito sortudo por ter sido parte da história dela como atriz”.
Gaga também ajudou a construir a performance de Cooper como músico. Ela escreveu muitas músicas para a trilha sonora do filme e sentou com o ator no estúdio, respondendo suas perguntas sobre as logísticas do que acontece nos bastidores durante um grande show. Ela também falou sobre sua experiência pessoal com drogas, compartilhando o quanto as substâncias eram fáceis de se conseguir quando ela se tornou famosa.
“Havia muitas opções,” Gaga disse. “É muito solitário ser uma performer. Há uma certa solidão que eu sinto, de qualquer forma — de que eu sou a única que faz o que eu faço. Então parece que ninguém entende. E a necessidade de usar é porque você está buscando uma forma de reprimir a dor. Quando eu comecei a me apresentar pelo país em boates, havia drogas para todo lado, mas como eu já tinha usado quando era mais nova, eu não me interessei. Eu era capaz de evitar isso porque eu usei quando era jovem”.
Enquanto A Star Is Born embarca no circuito das premiações do outono — o filme avança para o Festival Internacional de Filme de Toronto depois de Veneza — Gaga diz que está orgulhosa de sua performance porque ela sabe que “deu tudo”. Depois de ser forçada a cancelar muitos shows esse ano por causa da fibromialgia, ela está pronta para retornar aos palcos dia 28 de Dezembro, quando irá começar a residência em Las Vegas (ela não irá revelar se as músicas de A Star Is Born serão parte do show).
Ela gostaria de atuar mais, mas não apenas ‘‘em benefício de ser uma atriz. Eu quero contar grandes histórias que vêm de lugares reais dentro de mim, de dores reais, de emoções reais da minha vida real”.
Gaga parece mesmo ter um dom para acessar facilmente suas emoções. Quando a conversa volta para autoconfiança — como ela começou a se sentir bonita depois da avaliação da indústria a respeito da aparência dela — os olhos dela se enchem de lágrimas.
“Para ser honesta, eu acho que o que faz eu me sentir bonita é quando eu vejo a felicidade nos meus fãs”, ela diz, sua voz um pouco engasgada. “Quando eu vejo ou ouço deles que a música que eu fiz mudou a vida deles de alguma forma, é isso que faz eu me sentir bonita. Porque isso é apenas o exterior, sabe? E no final do dia, eu poderia estar em um milhão de filmes e ter um milhão de músicas e todo mundo iria dizer, ‘Ela é tão bonita’, mas não é o que eu quero. Eu quero que digam, ‘Eu vi aquele filme, chorei para caramba e aprendi algo sobre eu mesmo’”.
O filme Nasce Uma Estrela estreia dia 5 de outubro nos Estados Unidos e 11 de outubro no Brasil.
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Tradução por Vanessa Braz de Queiroz
Revisão por Kathy Vanessa
Imagem: Reprodução/Divulgação