Quase uma década após ter sido usado por Lady Gaga no MTV Video Music Awards, o famoso vestido de carne continua gerando polêmica e discussões que tomam as manchetes de portais de notícia.

Recentemente, diversas listas de final de década têm mencionado o look como um dos momentos mais marcantes dos últimos dez anos, mas foi principalmente após uma entrevista concedida por Billie Eilish e seu irmão Finneas O’Connell criticando o uso do vestido, que o assunto voltou a ser um dos mais comentados na internet.

O que até mesmo poucos fãs sabem é o motivo pelo qual Lady Gaga usou o controverso vestido, que a mesma define como um ato político pela igualdade.

Neste flashback, vamos entender a história do movimento que inspirou a artista a criar o look.

Em 2010 Lady Gaga estava comprometida a lutar pela revogação da lei Don’t Ask, Don’t Tell (Não Pergunte, Não Conte), política de restrição das forças armadas dos Estados Unidos. A lei proibia esforços de oficiais para descobrir e expor membros LGBTQ+ do exército americano, como também restringia daqueles que fossem abertamente declarados homossexuais ou bissexuais o direito de servir às forças armadas.

Em outras palavras, membros da comunidade LGBTQ+ podiam servir ao exército, contanto que não fossem assumidos e/ou descobertos e expostos, em um dos países que mais propaga a cultura do patriotismo e tem como construção social o ato de servir à pátria, a maior honra de um cidadão americano.

Existiam esforços para revogar a política Don’t Ask, Don’t Tell desde os anos 90 e conceder plena igualdade no direito de servir às forças armadas, mas o movimento ganhou força principalmente em 2008, a partir da candidatura à presidência do então senador Barack Obama, cuja campanha defendia total revogação dessa lei.

Após a eleição de Obama, que assumiu a presidência em janeiro de 2009, a pressão popular para que finalmente fosse posto um fim na política de restrição, tomou grandes proporções e o movimento teve o apoio de figuras de grande influência na mídia – dentre elas, Lady Gaga, que chegou a discursar em frente à Casa Branca durante o evento National Equality March (Marcha Nacional Pela Igualdade), que contou com a participação de aproximadamente mais de 200.000 pessoas em Washington, em outubro de 2009.

Depois de declarar seu apoio ao movimento em diversas ocasiões, Lady Gaga então decidiu aproveitar a atenção que receberia no VMA 2010 para dar um passo além.

Na edição do evento daquele ano, a cantora havia conquistado o recorde de maior número de indicações em uma única noite, em 13 categorias, dentre elas o principal prêmio da noite – o de Videoclipe do Ano.

Gaga estava no auge da carreira, havia sido a artista feminina mais pesquisada em 2009, possuía até então o videoclipe mais assistido da história do YouTube (Bad Romance), e sua popularidade crescia cada vez mais.

Havia muita expectativa em torno de sua participação no evento, conhecido por grandes momentos que marcaram para sempre a cultura pop, todos esperavam que ela superasse a repercussão de sua performance de Paparazzi no ano anterior, e foi isso que ela fez.

Ao chegar no evento, Lady Gaga passou pelo tapete vermelho acompanhada de quatro ex-soldados LGBTs das forças armadas que haviam sido depostos de seus cargos por conta da política Don’t Ask, Don’t Tell.

Mais tarde, após já ter recebido 7 prêmios (dos 13 aos quais concorria), ao final da noite, Gaga se tornaria a protagonista de um dos momentos mais chocantes do mundo da música, da moda, e da cultura pop em geral: sobe ao palco ao ser anunciada como a vencedora do prêmio de Videoclipe do Ano por Bad Romance usando um vestido feito de carne crua (combinando com o salto, a bolsa e um bife como adereço em sua cabeça).

Em seguida, pede para Cher segurar sua bolsa de carne, e com o principal prêmio da noite em mãos, cumpre a promessa de que se ganhasse, cantaria um trecho de seu próximo single, “Born This Way”, música que promove a autoaceitação e é considerada hoje um hino da comunidade LGBTQ+.

A repercussão foi imediata e o look rapidamente se tornou o assunto mais comentado da noite. Muita polêmica foi gerada a respeito da escolha, acompanhada de críticas ferrenhas, incluindo uma nota oficial publicada pela PETA, principal organização pelos direitos animais nos EUA, que definiu o vestido como “ofensivo”.

Em entrevista para o programa 60 Minutes, Lady Gaga falou sobre o vestido.

"A implicação moral, ética e política daquela roupa ia muito além do que a maioria das pessoas pensam, que é “eca”, certo? “Eca!”. Mas a realidade é que eu estava lá com quatro soldados que haviam sido exonerados de seus cargos pela política “Don’t Ask, Don’t Tell” e o que eu realmente estava tentando dizer é que carne morta é carne morta. E qualquer um que está disposto a dar sua vida e morrer pelo seu país, é igual. Você não é um gay morto, ou um hétero morto. Você está simplesmente morto", disse a cantora.

O projeto de revogação da lei de restrição, defendido pela cantora no manifesto, acabou sendo aprovado e sancionado por Barack Obama no dia 22 de dezembro de 2010, permitindo que pessoas LGBTQ+ servissem a qualquer área das forças armadas tendo o direito de assumirem e expressarem livremente sua sexualidade.

Apesar das duras críticas, não se pode negar que Gaga conseguiu o que queria, o que a mesma descreveu como “usar a atenção da mídia para fazer um manifesto político”.

Entre a aclamação e o desprezo, o vestido de carne também é reconhecido como um ícone fashion e a noite do VMA 2010 será para sempre lembrada como um dos maiores momentos na carreira de Lady Gaga.

Acompanhe todas as novidades sobre a Lady Gaga em nossas redes sociais: Facebook, Twitter e Instagram.

Imagem/reprodução: MTV

Texto por Samuel Banck