Lady Gaga e Bradley Cooper estão em Veneza, para o lançamento de "Nasce Uma Estrela". Por conta disso, inúmeras reviews de sites variados estão aparecendo.

A Variety (revista estadunidense semanal especializada em cinema, em negócios e na indústria do entretenimento), também publicou sua review sobre o filme, que recebeu nota 100 da mesma. Fazendo nossa ansiedade aumentar ainda mais.

Leia o que foi dito pela revista:

Contém spoilers

"Review Cinema de Veneza: Bradley Cooper e Lady Gaga em ‘A Star Is Born’

Bradley Cooper e Lady Gaga estão incríveis juntos em um remake rock ‘n’ roll arrebatador de uma saga romântica que nunca fica velha.

‘A Star is Born’ é aquela coisa que sempre ansiamos, mas tão raramente temos a chance de ver: um filme transcendental de Hollywood. É o quarto remake de uma história que se iniciou em 1932, mas esse tem uma aparência e uma vibe própria - arrebatadora e fabulosa, mas também delicada, íntima e luminosa. O filme é datado nos dias de hoje, mas em espírito é um drama retrô sofisticado dos anos 70 construído ao redor do fluxo incrível que se desenvolve entre duas estrelas do filme: Bradley Cooper, que interpreta Jackson Maine, um alcoólatra, um caipira do rock ‘n’ roll que apesar de ainda estar se segurando como atração popular, perdeu o desejo por aquilo que está fazendo, e Lady Gaga, na sua encantadora e bem sucedida estreia como estrela do filme, interpretando Ally, uma cantora-compositora nova que se torna seu amor e parceira no palco antes de se aventurar por conta própria na nova estratosfera pop.

Ela decola enquanto ele lentamente cai - esse é o conceito de tragédia de ‘A Star Is Born’. Mas o que o filme busca é pegar essa gangorra romântica e melodramática e transformar em algo indelevelmente sincero e revelador. Cooper dirigiu o filme, trabalhando de um script que ele co-escreveu com Eric Roth e Will Fetters, e dizer que ele faz um bom trabalho seria minimizar o seu sucesso. Como cineasta, Bradley Cooper fica na corda bamba, encenando cenas que gastam tempo e terminam com uma intimidade emaranhada que modifica as ‘batidas’ comuns. A nova ‘A Star Is Born’ é um nocaute emocional, mas é também um filme que faz você acreditar, em cada passo, no arrebatamento complicado que a história está contando.

Na versão de 1976, protagonizado por Barbra Streisand e Kris Kristofferson, tivemos algumas músicas de amor incríveis, mas elas não pareciam nem de perto músicas de um palco de rock no estádio, e nem Streisand, o que é parte do motivo pelo qual o filme veio com uma limitação ridícula. Pareceu preso, meio que uma incompetência sincera e vulgar entre três mundos: Antiga Hollywood, Nova Hollywood e a fantasia de princesa do rock de Barbra Streisand.

Mas dos momentos de abertura eletrizantes dessa nova versão, nos quais Jackson, bêbado e cru, com seu estrabismo queimado pelo sol e sua sensualidade implacável caipira, sobe no palco de um estádio gigante e se lança em uma música lenta de rock que soa como ‘‘Victim of Love’’ - parecia Eagles assim como Allman Brothers, o filme é arrepiantemente autêntico. E essa não é uma pequena façanha. Hollywood quase nunca sai bem ao tentar dominar o mundo do rock, mas ‘‘A Star Is Born’’, apesar de ser uma completa história de amor, é o filme mais bem vivido dentro do mundo rock desde de ‘‘Quase Famosos’’. E isso aparenta ser certo, soa certo, parece certo, a credibilidade define o palco para tudo que vem depois.

Jackson, que parece estar com quase 40 anos, esteve presente tempo suficiente para agora ocupar uma zona cinza entre lenda e nostalgia. Ele ainda pode lotar uma arena de fãs gritando, e seus antigos hits se tornaram clássicos do rock, mas seu som e personalidade já fugiram há muito tempo de seu espírito. Seu jeito de bandido - a barba e o chapéu de fazendeiro, o olhar de macho embriagado de Kristofferson/Skynyrd - o marcam como uma relíquia carismática, e a grande ironia é essa: Essa aparência, esse som, tem a ver com uma era quando o rock ‘n’ roll gabava sua ‘‘autenticidade’’, mas agora que está fora de moda, a autenticidade de Jackson parece mais do que nunca um conceito do showbiz, congelado no tempo. É um papel que ele está interpretando, uma imagem que está trabalhando - e secretamente batalhando - para manter viva. Tem uma balada dele que fala ‘‘Talvez é hora de deixar os velhos hábitos morrerem’’, e quando ele escreveu isso (muito tempo atrás), ele provavelmente não sabia que ele estava falando dele mesmo.

No primeiro dos muitos cortes, o filme sai da sua glória no palco para Jackson entrar na parte de trás do seu carro, cansado e sozinho, pegando uma garrafa de gim que ele tinha lá. Ele bebe um gole, e Cooper, atuando com seu corpo, deixa você sentir o quanto Jackson (entre tosses doentes) precisa de uma força vital daquela bebida. É no que ele acredita mais do que no show que ele acabou de terminar.

Como você interpreta um bêbado? Nós sabemos, claro, que a resposta não é ‘‘se fazer de bêbado’’, mas Cooper não só evita o comum cambaleamento (apesar de que em alguns momentos ele faz um pouco disso também, e é poderoso). Ele traz algo que eu raramente vi sendo feito tão admiravelmente: ele enche a cara, muito prático no seu elemento, ele sorri e reflete a embriaguez. Jackson fala com um grunhido profundo, baixo e deliberadamente sulista - uma voz com música real, mas que permite que você saboreie toda a bebida em que ela está marinada.

Precisando de outra bebida, ele pede que seu motorista o deixe no primeiro bar disponível, o que no final das contas é no acostamento, em um bar drag em noite de karaokê. Não é a ‘praia’ dele, mas ele não se importa com isso. Ele é a mesma celebridade em qualquer lugar que vai, então ele está no humor perfeito de felicidade quando ela entra no palco.

Ela é Ally, a performer não drag da noite (ela é amiga de todas as queens lá, então elas deixam ela cantar). Quando ela entra no palco, o filme faz um truque. Nós já vimos Ally terminar com seu namorado pelo celular, deixando um choro penetrante no processo, e quando ela aparece com uma maquiagem branca pesada e cílios colados em semicírculo, seu cabelo preso em um penteado um tanto quanto francês, então ela canta uma versão de ‘‘La Vie En Rose’’ que percorre todo o bar que ela ordenha para cada floreado de teatro cafona que ela puder, nós pensamos, ‘‘Claro! Que coisa mais Gaga!’’ Nos bastidores depois do show, Jackson gentilmente tira um dos cílios de Ally e a chama para uma bebida.

Mas quando ela volta do camarim sem todas os adornos de Gaga, ficamos chocados em ver uma jovem mulher com cabelo castanho suavemente liso e o sorriso mais doce, e esse é o jeito do filme de dizer: Senhoras e senhores, conheçam Lady Gaga, a atriz. Uma personagem que não vimos antes.

Ally não erra, tem ousadia de sobra (mais tarde naquela noite, quando Jackson é confrontado em seu bar policial preferido por um homem que ele traiu, ela dá um soco nele), mas Gaga, em uma performance exuberante e vencedora, nunca deixa sua qualidade de estrela entrar no caminho da personagem. Ou melhor, ela nos deixa ver que qualidade de estrela é algo que vive em Ally, mas ainda está esperando para aparecer (da mesma forma que a jovem Streisand em "Funny Girl"). Ally trabalha para uma empresa de serviço de buffet e mora com seu pai, o obcecado por Sinatra e passivo-agressivo Teddy Lorenzo (Andrew Dice Clay), em um bairro ponte-túnel do que parece ser Nova Jersey, e ela e Jackson estabelecem uma conexão não forçada. Ele pode baixar a guarda perto dela, e sua melancolia tristonha começa a desaparecer.

Cooper fez uma terna história de amor que nunca é exagerada, um filme lírico que desafia a ser quieto. Ally tem algo que Jackson reconhece porque ele costumava ter também: a paixão de compositor, a adrenalina de pegar sua própria história e transformar em um poema de toca-discos. Eles têm uma ótima conversa sobre o nariz Romano dela - que fala, sabiamente, dos preconceitos da indústria da música que Gaga enfrentou no seu caminho ao topo. Ally acha que o nariz dela é muito grande (ou disseram para ela), mas Jackson acha que é bonito - e, claro, ele está certo.

Ele escuta uma música que ela escreveu, e pode dizer que ela tem o dom, então depois de levá-la em um de seus shows, ele de repente a chama para o palco para cantar aquela música com ele. É chamada ‘‘The Shallow’’, e quando as vozes deles se juntam no verso ‘‘We’re far from the shallow now’’, nós nos derretemos junto com eles, e quando Ally de repente aumenta o tom da música, você irá sentir arrepios passando pelo seu corpo. É um momento absolutamente extasiante, porque é sobre a fusão de duas vozes e almas, sobre Jackson voltar à vida, sobre Ally percebendo seu destino, e sobre a redescoberta do público do que o romance em um filme ainda pode ser: um combustível para o coração.

Jackson quer que Ally se torne uma estrela? Mais ou menos. Ele é quem torna isso possível, mas depois que um vídeo do dueto ao vivo deles se torna viral, depois do show ela se aproxima de um empresário de rock, Rez (Rafi Gavron), que fala para ela o famoso ‘eu posso te tornar uma estrela’. Imediatamente, nós sabemos no que isso vai dar: em um lugar onde Jackson não vai gostar. O empresário representa a dissolução da influência de Jackson sobre Ally, algo que o filme se posiciona em termos feministas e contemporâneos. Em seu jeito dissoluto, Jackson é baseado no antigo estabelecimento masculino, um lugar onde Ally pode ser uma "cantora de garotas". O que ele não percebe é que ela vai abraçar o estrelato do seu próprio jeito, não do dele.

A performance maravilhosa de Rafi Gavron como Rez, o empresário difícil, é um ótimo exemplo do que há de tão interessante em ‘‘A Star Is Born’’. Nós vimos esse personagem - esperto, britânico, corporativo - antes, e ele sempre era interpretado como uma peste traiçoeira que simboliza o grande mercado. Mas não é a forma que Gavron o interpreta. Ele torna Rez uma pessoa honesta, inteligente e convincente, e o filme nunca o coloca como um corrupto.

Ao invés disso, excede nossas expectativas. Ally é ligada na máquina do pop do século 21 - coreografia robótica impressionante, um novo look glam com cabelo bem ruivo, toda uma mídia, completa com uma performance meticulosamente cronometrada no ‘‘Saturday Night Live’’ - e nós percebemos que o filme mostra a ascensão da própria Lady Gaga. A fascinação disso é que ao invés de satirizar a jornada de Ally como um mergulho na decadência do mercado sintético, o filme diz, em essência: Esse é o novo panorama, é o mesmo panorama antigo. Próximo do mundo de Jackson, parece "artificial" (e espectadores de uma certa idade vão ver automaticamente dessa forma), mas o mundo de Jackson provavelmente parecia artificial para a geração antes dessa. O filme diz que no pop (assim como na vida), é sempre hora de velhos hábitos morrerem, para que os novos hábitos possam nascer.

É com isso que Jackson não consegue lidar, e é por isso que ele bebe. Cooper tem algumas cenas nas quais Jackson fica feio: ele ‘‘carinhosamente’’ suja o rosto de Ally com bolo, e quando ela está tomando banho, e ele está muito bêbado, ele começa a provocar ela e até mesmo mostra a letra F (‘‘feia’’), o que nos choca. Mas é parte do poder de ‘‘A Star Is Born’’ de que o relacionamento deles nunca é de uma mão só; é terno, sexy, raivoso, ciumento, e triste, tudo ao mesmo tempo. É amor de verdade, e poderia ter ficado assim se Jackson não fosse tão destruído. O filme nos deixa tocar na sua lesão, do corpo e da alma: a perda acompanhada por zumbido (que nós podemos ouvir na trilha sonora), o senso de passar por emoções do estrelato por tempo demais deu-lhe um nó de exaustão. Sam Elliott, com cabelo branco, sua franqueza triste mais afiada do que nunca, interpreta o irmão mais velho de Jackson, Bobby, que tem sido seu empresário por anos (mas que tem que limpar as bagunças de Jackson), e os dois atores oferecem suas lutas, e abraços, algo profundamente enraizado no passado. Eles tiveram uma vida difícil ao crescer com um pai alcoólatra, e ainda estão tendo.

A melhor versão de ‘‘A Star is Born’’ sempre foi a de 1954, a versão de George Cukor: temperamental, purpúreo, extravagante, levado pela febre auto-dramatizante de Judy Garland. A cena que você irá lembrar melhor, além de Garland cantando ‘‘The Man That Got Away’’, é o tapa de Garland no bêbado James Mason durante o Oscar - um dos momentos mais ultrajantes na história de um filme. No novo ‘‘A Star is Born’’, Bradley Cooper faz uma homenagem a esse momento em uma cena no Grammy, e até supera o outro filme na extravagância em poder masoquista de piada doentia. E ele faz isso de forma convincente. É parte da atração magnética dessa versão - é, também, um romance melhorado pelo espelho sedutor e cruel do showbiz. Ainda assim, tem uma humanidade despida que deixa você impressionado. Essas duas pessoas, a estrela em ascensão e a estrela em declínio, aprisionados em um amor tão verdadeiro como despedaçado, e os dois, no final, se tornam nós. ‘‘A Star Is Born’’ é mais que uma regressão - é um lembrete de que todos os filmes são feitos das grandes paixões desajeitadas.

"Nasce Uma Estrela" estreia dia 11 de outubro no Brasil.

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Fonte

Tradução por Vanessa Braz de Queiroz

Revisão por Kathy Vanessa

Imagem: Reprodução / Variety