Completando 7 anos desde seu lançamento (no Japão) nesta sexta-feira (6), "ARTPOP" vem recebendo uma atenção bem diferente de como ocorreu alguns anos atrás.

Considerado por muitos um álbum à frente do seu tempo, em 2013, o álbum recebeu duros comentários da crítica especializada, sendo chamado de flop e um fracasso na carreira de Lady Gaga, que sofreu com diversas alterações em sua gestão e vários planos cancelados.

Com a remoção da canção "Do What U Want" da tracklist devido ao envolvimento e às acusações de estupro contra o cantor R. Kelly, o álbum foi relançado no ano passado no Reino Unido, o que despertou um novo olhar do público e da crítica depois de 6 anos de seu lançamento.

A revista VICE publicou, na manhã desta sexta-feira (06), um artigo destacando os principais motivos do disco ter sido tão rejeitado e em como sua musicalidade e arte se tornaram tão atuais. Vale destacar que na época do lançamento e divulgação do disco, a revista publicou uma matéria sobre "o fim lento e amargo da carreira de Lady Gaga".

Confira a tradução completa do artigo:

"‘ARTPOP’ é bom, na verdade

Em seu sétimo aniversário, nós revisitamos o complicado terceiro álbum de Lady Gaga e seu impacto em sua abrangente carreira.

Se você colocar “ARTPOP” no Google, os primeiros resultados são como você espera: Wikipédia, Amazon, Spotify. À medida que você vai navegando para baixo, no entanto, a página começará a vomitar artigos chamados “ARTPOP de Lady Gaga é melhor do que você se lembra?” (Frieze, 2019), ou “Em defesa de ARTPOP da Lady Gaga” (Paper, também de 2019.) O tom dessas manchetes fala sobre uma reviravolta crítica recente de um álbum que, quando lançado em 2013, era essencialmente – e injustamente – declarado um flop.

Essa reconsideração de ARTPOP foi provavelmente provocada pela própria Gaga (assim como o ‘relançamento’ do álbum em 2019.) No ano passado, pouco tempo depois do álbum completar seis anos, ela tuítou, “Eu não me lembro de ARTPOP”, parecendo comprar a reputação desfavorável do álbum. A piada provocou uma campanha de fãs entre Little Monsters, #JusticeForARTPOP [justiça por ARTPOP], e um número de analistas, como aqueles que eu fiz referência, apesar de continuar sendo um de seus álbuns mais pesadamente discutidos.

Chegando em 2013 como o sucessor do comercialmente astronômico e criticamente aclamado Born This Way, de 2011 – um álbum que tanto vendeu mais de um milhão de cópias na sua primeira semana quanto foi descrito pela Rolling Stone na época de seu lançamento como um trabalho “desconcertantemente ótimo” de uma “visionária do pop” –, ARTPOP sempre terá que superar expectativas altas demais. Depois de sete anos, no entanto, à medida que a sombra de Born This Way paira menos sobre o álbum, e com quase uma década de contexto extra sobre Gaga e sua carreira para considerar, agora parece um momento decente para refletir sobre as razões pelas quais o álbum foi pensado como um fracasso, para examinar seu lugar em sua obra, que agora é muito maior, e para revisitar a música, que é majoritariamente ótima.

Se você ouvir os dois álbuns lado a lado, ARTPOP não é tão diferente de Born This Way. Enquanto comercializa a tendência de Born This Way em direção ao rock nostálgico virado para disco, também, crucialmente, inclui muito dos arquétipos que ouvintes passaram a esperar de um álbum de Gaga. A balada no piano, encarnada por “Speechless” e “Yoü and I” anteriormente, manifestada como “Dope” – uma das melhores performances vocais de Gaga – em ARTPOP. E também estava neste álbum sua coleção de hits sobre moda – modelos de passarela com letras que fazem referência à alta costura, um aceno a “Black Jesus Amen Fashion”, de Born This Way – apareceram de forma própria, via “Donatella” e “Fashion!” (e esta coleção, você poderia concordar, foi expandida esse ano também pela faixa que fecha o Chromatica, “Babylon”).

Mas, em 2013, a fadiga com a “coisa toda” de Gaga – sua obsessão com o estrelado como um conceito e suas éticas públicas excêntricas, como quando ela apareceu no Grammy em uma incubadora – se estabeleceu. Hoje em dia, estamos familiarizados demais com o conceito de exposição exagerada de celebridades, uma armadilha fácil de se cair através de ciclos sucessivos rápidos de álbum e redes sociais. Mas sete anos atrás, não estávamos necessariamente dominados por esse pensamento. De certa forma, Gaga era o desenho de nossa concepção contemporânea de superexposição, sempre com um truque ou outro, provocando blog atrás de blog a perguntar, “GAGA FEZ O QUÊ?”.

ARTPOP teve uma estética diferente de Born This Way. O álbum contou com Marina Abramović entre suas supostas influências, e ostentou uma capa de Jeff Koons, abraçando o cânone da arte ocidental do látex, couro e blasfêmia religiosa que Gaga anteriormente reivindicou para si. Realmente ela falou ao Guardian em 2013, “Eu, na explicação mais metafórica, fiquei de pé em frente ao espelho e tirei a peruca, maquiagem, roupa e coloquei um boné preto na minha cabeça, cobri meu corpo em um collant preto, olhei para o espelho e disse: 'OK, agora você precisa mostrá-los que você consegue ser brilhante sem aquilo”.

Mas apesar de ARTPOP parecer diferente, o álbum ainda flerta com muitos temas anteriormente tocados por Gaga – como sua própria fama – e se baseou no mesmo tipo de performance “bizarra” que ela estava fazendo nos últimos dois anos, basicamente de forma ininterrupta. Muitos Little Monsters amaram, mas para o público geral, que pode ser perdoado por prestar menos atenção à complexidade das intenções de Gaga, o espetáculo estava se tornando cansativo, e o novo álbum, essencialmente, estava chegando em uma conjuntura que era muito menos apaixonante com a renovação de Gaga.

No seu lançamento em novembro, apenas 18 meses depois de Born This Way, ARTPOP recebeu algumas críticas que eram apenas OK – uma crítica demonstrativa de três estrelas do Guardian chamou o álbum de “Uma mistura de Gaga com alguns agudos ridículos, digressões questionáveis [...] e muitos fillers agradáveis”. As vendas do álbum seguiram o exemplo: vendeu 258,000 cópias na sua primeira semana, o que rendeu o primeiro lugar na Billboard 200, apesar de que Born This Way tenha vendido quase o quádruplo na mesma quantidade de tempo. Como Chris Molanphy argumentou para a Pitchfork na época: “O problema de Gaga, na minha percepção, é que ela não pode ser medida pelo mesmo critério de outras estrelas”. No contexto da carreira super elogiada de Lady Gaga até então, "apenas OK" parecia fracasso.

Assim, ARTPOP sempre foi, de certa forma, manchado, apesar de muitas de suas faixas serem excelentes. “Dope”, como eu mencionei, recebe um de seus vocais mais enfaticamente emocionantes fora de seu trabalho mais recente em Nasce Uma Estrela, enquanto o hino Botticelli-se-ele-pintasse-aliens-robôs “Venus” tem o mesmo sabor da deliciosa e louca Gaga e sua letra sobre “camisinha para ouvido” em “Judas”. “Sexxx Dreams” alterna seu som de discoteca sujo para um refrão satisfatório de feixe de laser, enquanto “Gypsy” volta para faixas de Born This Way como “Hair” e “The Edge of Glory” para um momento de sinceridade guiada por um violão.

Embora o fracasso do álbum diminua sua eficácia geral (“G.U.Y.” é complicada e confusa, e apesar do gosto de Gaga, “MANiCURE” não se solta), muito de ARTPOP é Lady Gaga em seu auge, e muito dele — a não menos importante “Donatella”, com seu refrão inicial de “Eu sou loira, sou magra, sou rica ... e sou um pouco vadia” — permaneceu desesperadamente subestimado até o último ano ou mais, pois o álbum passou a ser reconsiderado.

Agora que sabemos como as coisas aconteceram para Gaga, no entanto – a transfiguradora em que ela se tornou, e as escolhas que ela fez depois de ARTPOP – é interessante considerar como um flop aparente pode ter sido parte necessária de sua narrativa. Uma das coisas mais atraentes sobre a carreira de Lady Gaga é a autoconsciência com a qual ela a tem abordado constantemente. É muito claro que ela se preocupa com seu estrelato como matéria artística, já que ela continuou em ARTPOP em um nível textual. Mas mesmo quando ela não está cantando sobre fama, Gaga está sempre envolvida com isso em um nível meta – ela tem usado de forma autoconsciente tantos de seus disfarces, afinal de contas. Seu momento em Nasce Uma Estrela, por exemplo, foi como se Lady Gaga estivesse interpretando o papel de uma mocinha encantadora de Hollywood, influenciando os eleitores do Oscar e imitando Judy Garland e Barbra Streisand no tapete vermelho, assim como Lady Gaga interpretou o papel de Ally no filme.

Mas foi somente depois de ARTPOP que ela começou a buscar outros papéis além de Estrela Pop Bombástica, ou Estrela Pop Bombástica, Mas Com Algumas Referências Artísticas, com seriedade. É possível que, por bem ou por mal, a reação ao álbum tenha feito ela mudar de tática e a abraçar seus papéis subsequentes com mais pé no chão e de forma mais "autêntica" – a Cantora de Salão; a melhor compositora – enquanto ela tentava diferentes tipos de fama.

Apesar de esses experimentos nem sempre terem funcionado (Joanne, por exemplo, tende a ser visto como o maior erro da carreira, e o status desse álbum como flop levou muitos a olharem com mais bondade para o ARTPOP), é o jeito camaleônico de Gaga que, no final das contas, se tornou seu cartão de visitas. Sua última reviravolta a viu ir de fazer a trilha sonora de um filme a se tornar uma residente em Vegas, a retornar para sua potência total como estrela pop com um álbum voltado para o house, o matador Chromatica, lançado no meio do ano. E sim, através de Chromatica, parece que Gaga fez sua paz com ARTPOP: seu vídeo mais recente, “911”, fez referências pesadas ao trabalho do pintor surrealista Salvador Dali.

Tudo se completa, e ARTPOP, apesar de não ter sido o maior sucesso comercial de Gaga, mais do que serviu seu propósito, fazendo com que ela explorasse sua própria arte – ao invés de fazer com que a influência dos outros seja sua principal declaração artística – e nos dando a estrela multifacetada que ela é hoje. E isso, independente da letra “Você é apenas um porco dentro de um corpo humano”, é o melhor e mais importante legado do álbum.


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Fonte

Tradução por Vanessa Braz de Queiroz

Revisão por Vinicius Bertozzi